ARTIGO: A CPI das universidades acabou…

ARTIGO: A CPI das universidades acabou…

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Assembleia Legislativa de São Paulo que visava apurar supostas irregularidades na gestão das universidades públicas estaduais encerrou-se no dia 5 de novembro.

Apresentei, nessa reunião final, voto em separado que demonstra minha contraposição ao relatório oferecido pela relatora da CPI e está baseado nos princípios básicos de defesa da educação pública, gratuita, laica, de qualidade, desde a educação infantil até a pós-graduação.

O momento em que se realizou essa CPI foi oportuno, face às tensões provocadas pelo Ministro da Educação, Abraham Weintraub, que promove cortes dos investimentos no ensino superior e ameaça acabar com o FUNDEB, o que poderá ocorrer em 2020.

Por outro lado, quero ressaltar que o voto em separado que apresentei expressa o processo histórico de conquistas dos movimentos sociais em defesa da educação pública e gratuita para todos.

É possível se observar que a mudança de rumos da CPI, que teve início motivada por questões “ideológicas”, se deu como expressão das tensões entre o público e o privado e do rico debate realizado com as presenças dos reitores e pró-reitores da três universidades estaduais (USP, UNICAMP e UNESP) e dos representantes de suas fundações (FUSP, FUCAMP, FUNDUNESP).

Em meu voto, resgato uma questão fundamental: a política de cotas em vigor nas três universidades. Nelas, os assim chamados “ppi” (pretos, pardos e indígenas), combinados com a prioridade para estudantes oriundos do ensino médio das escolas públicas, ocupam 50% das vagas. Uma grande conquista social.

Meu voto recupera o processo histórico da luta por cotas para reduzir as desigualdades econômicas e sociais, relembrando que as primeiras escolas no Brasil não permitiam que pessoas pardas estudassem junto com as pessoas brancas. Hoje, a resistência às políticas de cotas que ainda existe mostra que a história se repete, mas a sociedade avança, no sentido de obter conquistas para seus filhos e filhas.

Destaquei, também, três pontos estruturais que não foram devidamente tratados pela relatora. O primeiro diz respeito à decrescente destinação de recursos financeiros para as universidades.

Embora esteja definido desde 1995 que devem ser repassados às universidades recursos correspondentes a 9,57% do ICMS, antes de se calcular esse montante o governo desconta os recursos destinados à habitação, juros e multas da dívida pública e o fundo estadual de combate à pobreza. Resulta que os recursos repassados têm sido cada vez mais insuficientes. Em dez anos, as universidades deixaram de receber R$ 5,3, bilhões.

O segundo ponto abordado trata da diferença entre o valor total da folha de pagamento dos benefícios previdenciários e o valor total das contribuições previdenciárias dos servidores. Dados de 2016 mostram que essa diferença chegou a 19,5% dos repasses oriundos do ICMS e projeções indicam que poderá chegar a 30%.

Na realidade, o problema ocorre porque o governo do Estado não cumpre a lei complementar 1010/2007, que criou a São Paulo Previdência (SPPREV), cujo artigo 27 determina que a responsabilidade pela insuficiência financeira, como acima definido, é do governo estadual.

Por fim, com relação aos salários acima do teto constitucional recebidos por alguns professores, destaco em meu voto em separado que esses valores são decorrentes de direitos conquistados na justiça. Além disso, são casos isolados, porque a verdade é que, nos últimos 4 anos, o quadro de docentes diminuiu mais de 10%, apesar do aumento no número de matrículas. Muitos desses professores e cientistas foram para as universidades federais, cujo teto salarial é maior. Portanto, é urgente que o governo do Estado resolva essa questão salarial.

Reitero que o debate entre público e privado foi uma constante no decorrer dos trabalhos da CPI, ao ponto de um dos deputados apresentar uma suposta dicotomia entre a educação básica e o ensino superior, defendendo o ensino superior privado o que, supostamente, fortaleceria a educação básica. Ora, nós defendemos o fortalecimento da educação pública e gratuita desde a educação infantil até o ensino superior, porque a formação qualificada de cientistas, pesquisadores e acadêmicos produz uma riqueza ainda mais inestimável que o dinheiro: a soberania conquistada por meio do conhecimento.

Tive a oportunidade de visitar o Instituto de Geologia da UNESP de Rio Claro e qual não foi meu orgulho ao saber que dali saiu um dos cientistas responsáveis pela análise das primeiras amostras do pré-sal, essa riqueza brasileira que agora foi em parte entregue a empresas estrangeiras por 2/3 do valor estipulado no leilão pelo governo Bolsonaro.

Nem o mencionado cientista, nem a UNESP aparecem nesse contexto social. Infelizmente, o presidente que menos faz pela educação brasileira está leiloando um tesouro cujos rendimentos seriam 75% destinados à educação e 25% destinados à saúde.

O que seria a educação brasileira se esses 75% dos rendimentos do pré-sal fossem nelas aplicados?! Poderíamos, em dez anos, atingir o patamar educacional de países europeus e poderíamos conquistar nossa soberania perante as nações, assegurando a autonomia intelectual de nossa juventude. Isso incomodou interesses obscuros e fez com que setores retrógrados da nossa sociedade se movimentassem para destruir o caminho que se desenhava para o futuro.

Registro, finalmente, outro motivo para meu voto em separado, que foi a iniciativa do presidente da CPI de promover a criminalização das nossas universidades, oficiando o Instituto de Criminalística sobre supostos indícios de irregularidades. Aquele órgão deu tão pouca importância que devolveu a questão à CPI, solicitando que tome o encaminhamento correto, ou seja, que é remeter ao Tribunal de Contas do Estado.

As universidades públicas do Estado de São Paulo são um patrimônio inestimável e temos que ser muito cuidadosos e responsáveis quando delas tratamos, para sermos fiéis ao que de nós espera o povo paulista.

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